quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

"e quando a gente acha que está no fundo do poço..."

Quarta-feira, 20/01

Finalmente, voltamos ao trabalho na ONG! No caminho, de manhã, já foi possível perceber que hoje é um dia festivo aqui na pequena Kharagpur. Descobri que é o dia da Deusa da Educação (ou sabedoria) que se chama Saraswatsi.

Nas ruas, as pessoas estavam bem ajeitadas (na medida do possível, dentro do contexto social) e enfeitadas e havia vários templos improvisados com pessoas na frente, ajoelhadas, sentadas ou varrendo a calçada.

Um fato que me chamou atenção foi que todas as imagens da deusa estavam com os rostos cobertos por panos brancos. Perguntei ao secretário da ONG o que aquilo significava e ele me disse que elas só poderiam "enxergar os fiéis" após a Puja, que é como eles chamam os festivais para as deusas.

Ou seja, o ritual de celebração de hoje é chamado Saraswatsi Puja, o da Deusa Durga, em outubro, se chama Durga Puja, e assim vai.

Em cada canto de Kharagpur, as pessoas estavam celebrando a Puja. Na ONG, não era diferente e as crianças estavam com suas melhores vestes para agradecer e pedir sabedoria à deusa.

Participamos de todo o ritual, descalças, e pudemos ver o Pandit fazendo as orações e oferendas, sentado em frente à imagem, enquanto as professoras e a crianças prestavam atenção. De vez em quando, o pandit tocava um sino e todos começavam a gritar e fazer barulho com alguns instrumentos.

Lá pelas tantas, uma das mulheres na sala começou a colocar as flores e folhas, oferecidas à deusa, nas mãos de todos. Após repetir as incompreensíveis palavras do Pandit, com as mãos em oração, todos jogamos as pétalas em direção a imagem. Então, erguíamos as mãos para cima e outra mulher borrifava água em nossa direção. Repetimos este gesto três vezes. Depois, o Pandit acendeu uma chama, em frente a deusa, sobre a qual deveríamos colocar a mão e fazer um estranho gesto sobre nossas cabeças.

Quando eu achei que tudo estava terminado, sentei no lado de fora da sala para calçar novamente meus tênis e uma terceira mulher veio em minha direção com um pote de barro que continha um líquido branco com algumas coisas, que não consegui definir o que eram, flutuando no topo. Estendi a mão, certa de que ela ia borrifar o líquido novamente, mas ela fez um sinal para que eu abrisse a boca. Hesitei por um momento, mas ela insistiu e eu acabei abrindo a boca, fechando os olhos e engolindo aquilo sem nem pensar no que poderia haver ali dentro.

As crianças estavam todas enfeitadas para a Puja e, quando viram minha máquina fotográfica, tentando registrar todos os momentos daquele ritual, começaram a me pedir para tirar fotos delas. E lá se foram quase todos os dois gigas do meu cartão de memória! Mas tudo bem, porque eu estava extremamente feliz de estar ali e poder vivenciar um tradicional festival indiano.

Saímos da sala das crianças e fomos, com os pequenos netos do presidente da ONG, conhecer o luxuoso e imponente templo que fica no pátio. Mas como nem tudo é alegria e diversão, logo voltamos ao escritório para trabalhar no projeto da Lua.

No fim da tarde, retornamos ao apartamento, onde descobrimos que a internet não estava funcionando. Ótimo! Então, decidimos ver um filme, mas logo na metade, a eletricidade se foi. De novo.

Esperamos o pessoal da AIESEC ir até o apartamento para resolver algumas questões com o senhorio e depois fomos até o campus tentar resolver o problema da internet no apartamento, que não estava mais funcionando. Problema não resolvido, como de costume, saímos, a Lua, a Sandra, o Felipe e eu para o restaurante chamado Little Sisters. Finalmente, consegui encontrar uma comida não apimentada! Morrendo de medo e de fome, pedi, às escuras, o Chicken Tikka e o arroz com vegetais. Para a minha surpresa, a comida estava ótima e eu não senti o gosto do chilli nenhuma vez!

Voltamos para o apartamento para esperar a chinesa que viria morar conosco. A coitada chegou à uma hora da madrugada, cansada, perdida e sem saber o que veio fazer aqui. Ela não lembrava o código de segurança da mala e ficou quase uma hora tentando abri-la. Cansada, ela perguntou se conseguiríamos arrombar a mala. Peguei uma faca e rompi o lacre em poucas tentativas. Ou seja, ainda estou desenvolvendo habilidades criminais aqui!

A Lua teve de dividir a cama com a chinesa, de nome Isis, porque ela não trouxe nem lençóis, nem cobertor, nem nada e a noite estava muito fria, como de costume.

Antes de dormir, olhando as frustradas tentativas de Isis em abrir a mala, Sandra me olhou e disse, em espanhol: “e quando a gente acha que está no fundo do poço...”. Concordei com a cabeça no meio da frase, porque sabia onde ela queria chegar. Todos os dias vemos gente em situações cada vez piores por aqui.

Um comentário:

  1. Hahaha... esses chineses são uma figura. Aqui tem uma que chegou a pouco, o cartão dela não funciona nos ATMs, ela tá quase sem dinheiro, o SIM Card dela tbm tá pifado e pra completar a história, ela entrou na India com Tourist Visa e colocou no formulário de imigração dela que ia trabalhar aqui... Resultado, a policia foi no flat dela hj, prendeu o passaporte dela e chamou ela pra uma audiência no Headquarters deles aqui... Até agora estamos sem notícia dela. A AIESEC daqui é foda...

    Mas é bem isso que tu falou... quando achamos que estamos mal, vemos que tem gente pior! Tudo isso pra desenvolver resiliência e adaptabilidade...

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