Quarta-feira, 20/01
Finalmente, voltamos ao trabalho na ONG! No caminho, de manhã, já foi possível perceber que hoje é um dia festivo aqui na pequena Kharagpur. Descobri que é o dia da Deusa da Educação (ou sabedoria) que se chama Saraswatsi.
Nas ruas, as pessoas estavam bem ajeitadas (na medida do possível, dentro do contexto social) e enfeitadas e havia vários templos improvisados com pessoas na frente, ajoelhadas, sentadas ou varrendo a calçada.
Um fato que me chamou atenção foi que todas as imagens da deusa estavam com os rostos cobertos por panos brancos. Perguntei ao secretário da ONG o que aquilo significava e ele me disse que elas só poderiam "enxergar os fiéis" após a Puja, que é como eles chamam os festivais para as deusas.
Ou seja, o ritual de celebração de hoje é chamado Saraswatsi Puja, o da Deusa Durga, em outubro, se chama Durga Puja, e assim vai.
Em cada canto de Kharagpur, as pessoas estavam celebrando a Puja. Na ONG, não era diferente e as crianças estavam com suas melhores vestes para agradecer e pedir sabedoria à deusa.
Participamos de todo o ritual, descalças, e pudemos ver o Pandit fazendo as orações e oferendas, sentado em frente à imagem, enquanto as professoras e a crianças prestavam atenção. De vez em quando, o pandit tocava um sino e todos começavam a gritar e fazer barulho com alguns instrumentos.
Lá pelas tantas, uma das mulheres na sala começou a colocar as flores e folhas, oferecidas à deusa, nas mãos de todos. Após repetir as incompreensíveis palavras do Pandit, com as mãos em oração, todos jogamos as pétalas em direção a imagem. Então, erguíamos as mãos para cima e outra mulher borrifava água em nossa direção. Repetimos este gesto três vezes. Depois, o Pandit acendeu uma chama, em frente a deusa, sobre a qual deveríamos colocar a mão e fazer um estranho gesto sobre nossas cabeças.
Quando eu achei que tudo estava terminado, sentei no lado de fora da sala para calçar novamente meus tênis e uma terceira mulher veio em minha direção com um pote de barro que continha um líquido branco com algumas coisas, que não consegui definir o que eram, flutuando no topo. Estendi a mão, certa de que ela ia borrifar o líquido novamente, mas ela fez um sinal para que eu abrisse a boca. Hesitei por um momento, mas ela insistiu e eu acabei abrindo a boca, fechando os olhos e engolindo aquilo sem nem pensar no que poderia haver ali dentro.
As crianças estavam todas enfeitadas para a Puja e, quando viram minha máquina fotográfica, tentando registrar todos os momentos daquele ritual, começaram a me pedir para tirar fotos delas. E lá se foram quase todos os dois gigas do meu cartão de memória! Mas tudo bem, porque eu estava extremamente feliz de estar ali e poder vivenciar um tradicional festival indiano.
Saímos da sala das crianças e fomos, com os pequenos netos do presidente da ONG, conhecer o luxuoso e imponente templo que fica no pátio. Mas como nem tudo é alegria e diversão, logo voltamos ao escritório para trabalhar no projeto da Lua.
No fim da tarde, retornamos ao apartamento, onde descobrimos que a internet não estava funcionando. Ótimo! Então, decidimos ver um filme, mas logo na metade, a eletricidade se foi. De novo.
Esperamos o pessoal da AIESEC ir até o apartamento para resolver algumas questões com o senhorio e depois fomos até o campus tentar resolver o problema da internet no apartamento, que não estava mais funcionando. Problema não resolvido, como de costume, saímos, a Lua, a Sandra, o Felipe e eu para o restaurante chamado Little Sisters. Finalmente, consegui encontrar uma comida não apimentada! Morrendo de medo e de fome, pedi, às escuras, o Chicken Tikka e o arroz com vegetais. Para a minha surpresa, a comida estava ótima e eu não senti o gosto do chilli nenhuma vez!
Voltamos para o apartamento para esperar a chinesa que viria morar conosco. A coitada chegou à uma hora da madrugada, cansada, perdida e sem saber o que veio fazer aqui. Ela não lembrava o código de segurança da mala e ficou quase uma hora tentando abri-la. Cansada, ela perguntou se conseguiríamos arrombar a mala. Peguei uma faca e rompi o lacre em poucas tentativas. Ou seja, ainda estou desenvolvendo habilidades criminais aqui!
A Lua teve de dividir a cama com a chinesa, de nome Isis, porque ela não trouxe nem lençóis, nem cobertor, nem nada e a noite estava muito fria, como de costume.
Antes de dormir, olhando as frustradas tentativas de Isis em abrir a mala, Sandra me olhou e disse, em espanhol: “e quando a gente acha que está no fundo do poço...”. Concordei com a cabeça no meio da frase, porque sabia onde ela queria chegar. Todos os dias vemos gente em situações cada vez piores por aqui.
Capítulo final
Há 14 anos
Hahaha... esses chineses são uma figura. Aqui tem uma que chegou a pouco, o cartão dela não funciona nos ATMs, ela tá quase sem dinheiro, o SIM Card dela tbm tá pifado e pra completar a história, ela entrou na India com Tourist Visa e colocou no formulário de imigração dela que ia trabalhar aqui... Resultado, a policia foi no flat dela hj, prendeu o passaporte dela e chamou ela pra uma audiência no Headquarters deles aqui... Até agora estamos sem notícia dela. A AIESEC daqui é foda...
ResponderExcluirMas é bem isso que tu falou... quando achamos que estamos mal, vemos que tem gente pior! Tudo isso pra desenvolver resiliência e adaptabilidade...